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Mostrando postagens com o rótulo vida

A vida sempre continua

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  Acordo mais tarde e já vou caminhar com o dia corrido nesta quarta-feira de cinzas onde a cidade adormecida recomeça a voltar sua vida de todo dia. Faço uma meia volta no parque, ladeando uma avenida cheia de árvores e um corredor de ônibus central. Enquanto olho o movimento no meio das árvores ouço um som que mexe comigo. Uma sirene de ambulância.  Já estive dentro de uma, correndo pelas ruas escuras da cidade, enquanto meu pai recebia atendimento e eu rezava para que tudo desse certo e chegássemos a tempo no hospital. Se antes eu já sentia aquele barulho como urgente, agora ainda mais. Sempre rezo para que tudo dê certo para quem ali dentro luta pela vida.  Olhei para o lado e, no corredor de ônibus, vejo três veículos. Um ônibus na mão normal. Uma ambulância com sua sirene tocando na contra mão. E na frente dela, outro ônibus em sua rota. Fico imaginando que um dos ônibus vai se mexer, ou os dois para que a ambulância siga seu caminho, duas quadras que está do pronto...

Se não houver amanhã

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Duas mulheres morreram incendiadas em um acidente. Quando eu vi a fumaça ao longe, não sabia que duas mulheres tinham sofrido um acidente e morrido, tentando combate-lo de dentro do carro, sem conseguir sair. Era apenas uma fumaça ao longe. Um estranhamento. Algo fora da rotina. Também vejo fumaças aqui e ali e são estranhamentos. Uns morrem tentando fugir de invasores. Outros morrem de doenças evitáveis. Muitos morrem por falta de dinheiro. Mas isso já é rotina nesse mundo cada dia mais estranho. Pessoas jogam bombas em outras pessoas em um metrô em uma metrópole enquanto os senhores da guerra tramam jogadas que vão encher de poder uns e enriquecer outros tantos que vão reconstruir o que foi destruído.  Enquanto isso morrem pessoas e sonhos. Crianças choram. Outros não conseguem deter o fogo de dentro de um carro. Ou de si mesmas. O mundo cada dia mais violente. O sol nasce como todo dia. Há enchentes e cataclismos. Mas também há pores do sol e namorados continuam a se apaixo...

O coração pensa constantemente - reflexões sobre o luto e a vida

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  O coração pensa constantemente. E irradia  impulsos eletromagnéticos com uma potência que nos conecta ao universo. Não por acaso, escolhi uma frase de vida para começar a falar do romance de Rosângela Vieira Rocha  que se chama O Coração Pensa Constantemente . Contando a história de vida e morte de duas irmãs, purga sua dor com o seu próprio luto. Acompanhei pelas redes sociais muito desse seu processo pessoal e a dor pela morte sofrida de sua irmã.  "cada luto é único e nenhuma perda se parece com a outra. De nada serve ter frequentado essa 'escola', pois não há aprendizagem e muito menos diplomas. Ninguém está preparado para a morte." Luto. É quando o coração da gente soluça.  N ada aproxima mais os seres humanos que a dor de perder alguém amado. Nos dias de pandemia que vivemos, essa dor se multiplica pelos milhões que morrem e pela ausência sofrida que deixam em outros milhões pelo mundo. Foi com esse sentimento, entre o meu particular e o geral e mundial...

Inspiração do dia - buscando

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Café e rádio. Companheiros do despertar. Nem sempre notícias, não mais, elas me causam algum desconforto. Só as mais urgentes. Como defino? Não defino, só ligo no início da manhã, naquele tempo de organização e colocação do espaço em ordem. Depois é água e música. Meu ofício de vida: arquitetar. Arquiteto espaços e arquiteto textos.  Também arquiteto sonhos e cuidados. E cuido. E quem cuida de quem cuida?  Na maior parte do tempo, o próprio cuidador que há de buscar sua força nele mesmo. Enxugar lágrimas e deixar fraquezas guardadas para um momento em que possam se expostas. Que quase nunca chega. A fraqueza de quem cuida assusta os que não cuidam. Ou os que são cuidados. A fraqueza assusta. O cuidador aprende logo a achar válvulas de escape. Não sei porque lembrei de um filme bem antigo, acho que era com a Annie Hall, na verdade Diane Keaton, que eu sempre vejo com as roupas da Annie..."Looking for Mr Goodbar" com um Richard Gere extremamente jovem. Ela cuidava de dia e extr...

Coisas da Coisa

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Sou uma pessoa lógica. Dito isso já explico que nem tanto. Mas no conjunto sim.  Meu pensamento tende a encaixar padrões em semelhanças e diferenças, estabeleço relações de nexo, obviamente baseadas no meu viés de vida, e teço conclusões.  Procuro não ser exageradamente sectária e para tanto tenho me afastado das certezas absolutas. Elas já me guiaram rumos em tempos de mais mocidade. Agora posso me dar ao luxo de ser mais cética e mais perplexa com a vida e as pessoas. Mas sempre tem as coisas da coisa. Ficou curioso? Siga o fio do grande pensador Raulzito a seguir:    Logica e razão são coisas da terra. Eu divido as coisas da terra, coisas do universo e coisas da coisa. E as coisas da coisa, minha filha, essas é que são o negócio, entende? Quem é que pode explicá-las? Raul Seixas Nesses tempos pandêmicos de pós verdades e sem verdades, onde versões valem mais que fatos, e a coerência tomou chá de sumiço, tento ainda estabelecer padrões mais ou menos lógicos p...

A travessia da velha senhora

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Catarina estava com sono e sem paciência naquela manhã em tudo invertida. Saíra apressada de casa para uma reunião daquelas do trabalho, onde todos falavam muito e decidiam pouco. Foi com um sonoro palavrão que brindou o sinal fechado na faixa de pedestres. Já ia colocar o pé apressado no pedal quando viu. José estava feliz. Tinha sido recém promovido. Comprara o carro novo, tão sonhado, e o anel de noivado para Joana. Ela não sabia, mas ia ser pedida em casamento naquela noite. José tinha temperamento romântico e gostava de adivinhar os desejos de sua amada. Estava conjeturando se tinha acertado nos inúmeros detalhes que tornassem a data inesquecível que só se deu conta, quando distraído, olhou em frente. Julieta tinha saído de casa, como todas as manhãs fazia. Ia comprar o pão no super mercado para tomar um café gostoso, com requintes de cuidados que fizera por mais de oitenta décadas. Seus cabelos brancos em um coque arrumado. Seus dedos, antes ágeis, meio entorpecidos pe...

só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido

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Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido. Fernando Pessoa Amar a vida porque é fugidia. Quando menos esperamos vem o destino, as escolhas, a Moira, seja lá o que acreditamos, cobrar seu preço e nos ceifar esperanças. Nossa vida tem dias contados. Não importa se amanhã ou daqui 50 anos. Um dia nossa hora chegará e nos encontraremos conosco. Não esqueço o suspiro do meu pai quando me despedi dele, foi como se reconhecesse que era hora enfim de parar de lutar. A luz que nos envolvia no momento me reconfortou. Espero com todas as forças que ele também a tenha sentido. Não sei o que pode nos consolar ao encontrar a porta da saída dessa nossa existência. Só quem passou por isso pode dizer, Nem todos voltaram. Uns dizem que enxergam um filme da vida. Outros uma imensa luz que traz paz. Há inúmeras explicações, tanto cientificas como esotéricas. Cada um de nós acredita na que melhor lhe explica. Ou reconforta. Esses dias escutei um áudio que...

O homem que coçava a orelha com um grampo

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Entrou no Uber. Pensou consigo mesma que não se faziam mais aplicativos como antes. Não mais os veículos pretos, com gente engravatada e cheia de mesuras. O motorista vestia bermudas. A rádio gritava as fofocas da novela. O carro já tinha visto dias melhores, a limpeza também. Mas a pressa era tamanha e a promoção que a fazia viajar de graça compensava tudo. Até achou graça quando, depois de espirrar pela janela, o motorista pegou um grampo e limpou a orelha... Cara! Nunca tinha visto nem um taxista daqueles táxis bem horrorosos fazer isso. Limpar a orelha com um grampo! Nem grampo se usava mais. Mas nestes tempos de surrealidade aquilo foi apenas um toque a mais. Se armou de bom humor porque nada ia empanar dentro dela a capacidade de ser simpática. Falou do tempo, da vida, do futebol. Deixou de lado os assuntos mais espinhentos porque sua natural diplomacia, aliada à sabedoria de décadas de vida, muitas vividas em uma ditadura, lhe ensinaram que nem tudo se fala abertamen...

As estrelas se apagam lentamente

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Noite. Algumas poucas luzes que brilham aqui e acolá. Poderia ser uma alegoria da minha alma. Aqui dentro também brilham algumas luzes. Poucas. Era de sensações sua precisão. Nem que fosse daquelas multicoloridas, podres de falsas, tipo sorvete derramado que se esvai e com ele a vontade tanta de comer aquela gostosura que é tão efêmera.    Mas como o picolé que se derrete na mão, lambuzando a roupa, os dedos, a vida, também a sua esperança parecia ir se colapsando. Sinais difusos aqui e ali. Uma ruptura eminente, corrigida por esparadrapos que são apenas lenientes. Nada permanentes. Mas não será a vida esse porvir de momentos sem muito sentido? Quem disse que a linha reta é caminho traçado desde a infância. Não serão as mentes mais confusas e caóticas do que gostariam de admitir? A julgar pelo que lia e via, sem dúvida. Gente que sempre achou tão inteligente, de repente saia com cada sandice. Ela para os outros devia também parecer assim incoerente. Que de certe...

Segundas precisam de histórias de Pai

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Ótimo! Acordar já é um privilégio. Acordar em uma cama tua, sob um teto teu, com possibilidade de comer e interagir com gente querida te faz uma pessoa que pertence à uma minoria bem específica da humanidade.  Sei lá se existe uma pesquisa que comprove isso, mas deve. Tudo é passível de pesquisas hoje em dia. Até o cansaço das segundas feiras. Afinal, quem não? Segunda feira é aquele dia em que tudo começa: trabalho, dietas, rota para os objetivos. Tudo adiado para a segunda que tem esse poder mágico de despertar o lado mais laborioso das pessoas. Isso para quem descansa nos fins de semana. Outra camada privilegiada. Como boa profissional liberal nunca tenho essa definição exata entre os dias da semana. Toda hora é hora de trabalho. Arquitetos entenderão. Mas ainda consegui reservar as manhã de sábado para meu reabastecimento. Isto antes de virar mãe e pai de meus pais. Eu, que não tive meus filhos, acabei tendo essa experiência mais tarde de cuidar de alguém....

Saindo da letargia e voltando a viver

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Eu e Stephen Hawking começamos a vida com algo em comum: a curiosidade e a paixão pela incógnita do universo.  Lembro que bem pequena já me perguntava se o universo era realmente infinito. E se fosse, esse nunca ter fim não me convencia. Mas se era finito, o que havia além dos seus limites.  Mas ao invés do cara inglês, minhas perguntas nunca passaram de mera curiosidade. Minha real vocação era ser útil ao próximo. Mas nem por isso pensem que virei uma missionária que fez relevantes serviços pela humanidade. Não. Meus caminho sempre foram mais prosaicos. E com certeza no dia que eu morrer poucas pessoas se lembrarão de mim após algumas semanas. No bem da verdade a arrogância que alguns levam na vida não sobrevive a uma semana de doenças.  Estar acometido de algum mal ou acompanhar alguém querido lutando para viver é das maiores lições de humildade e vida que se pode ter. Lembrem disso (e sinceramente espero que nunca tenham que vivenciar isso): a...

Do tempo em que chovia

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Seria um dia lindo se não fosse por um detalhe. Chovia.  Mas chovia como ela nunca tinha visto na vida. Nem mais sabia se aquela cachoeira toda era fora ou dentro dela.  Um lado seu, talvez o que ainda lhe ligava à vida normal, dizia que o sol brilhava. Se havia nuvens ou não, era de pouca importância. Crescerá com aquela certeza otimista de que o sol sempre há de brilhar. Em algum lugar. O outro lado. O outro. Aquele não. Aquele dizia que a tempestade apenas começava. Ela por acaso não tinha visto os sinais?  Primeiro a rotina. A bendita rotina. A maldita rotina. Os horários que tinham que ser cumpridos rigorosamente. Mesmo quandonao faziam sentido. Almoço ao meio dia. Em ponto. Todo dia a mesma coisa. Toda surpresa escondida em algum lugar perdido na memória.  Depois a repetição. A mesma pergunta. No mesmo horário. E de novo. E de novo. E de novo. E mais uma vez. Todo dia.  Só quem nunca viveu isso pode teorizar a respeito. A repetição é massacrante. Ela bem q...

Abriu a porta

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Abriu a porta. Tudo era novo naquele olhar que amanhecia para a vida. Correu os olhos pelas paredes em que a pintura carecia de novo retoque. Pousou seus dedos pelos móveis que revelavam um passado mais ditoso e onde os cupins marcavam sua fome.  "Para que uns sobrevivessem, outros tinham que fenecer." Riu da sua ideia. Pareceu tolice de adolescente, coisa que ela tinha uma vaga recordação de ter sido um dia. Mas mesmo assim, sorriu. A vida lhe pareceu boa. E fosse lá explicar esse milagre de achar graça onde tudo parecia ruína? Tem coisas que não se explica não. Se deixa sentir e só. Abriu a porta. Sentiu falta de uma violeta que pudesse lembrar ternura. Anotou mentalmente na sua lista de compras. Havia de sobrar uns trocados para um gesto de beleza. De repente entendeu o cara que morava na rua, aquele que trancrava a respiração, envergonhada, pelo cheiro que empesteava suas narinas, dos dias e anos sem uma gota de água a lavar humores e fluídos que de tão natur...

Focar - necessidade urgente

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FOCO!!!! Socorro, ando precisando de uma lente dessas que foque em um objetivo e me limite as possibilidades. Pessoa curiosa e muito pesquisadora enlouquece com uma biblioteca ficando sem saber qual livro escolher e já pegando meia dúzia para a mesa de cabeceira, namorando a ideia de ler e reler todos.  Nunca consegui fazer uma coisa por vez. Estudava vendo TV. Via TV jogando. Trabalha ouvindo música e navegando. Navegar. Daquela simples expressão que significava pegar um barco para a atual, passei ainda naquela de voar nas possibilidades: a tal navegar na maionese. Tudo bem que muita gente usa para se referir a pensar coisas que não vão acontecer de tão fantasiosas. Mas eu me apropriei no sentido de dispersão.  Dispersiva. Presente. Paro tudo e vou em busca do que me dá mais prazer no momento. E sou compulsiva muitas vezes. É ótimo para a mente e péssimo para o bolso. Há que haver um equilíbrio entre motivação e foco. E fazer dos objetivos um hábito que ...

Somos instantes

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Acordou saudades. Tirou a camiseta antiga que guardava seu corpo nas noites de insônia. Essa não. Dormira profundamente o tal do sono dos justos que lhe vinha de vez em quando. Cada vez mais quando. Quando tudo bem. Quando não questionava. Quando se enfurnava. Quando era quase sempre. Se fosse normal como tantos que conhecia, ia em um médico qualquer que lhe receitaria um para te quieto também conhecido por tarja preta. Mas não ela.  Acordou saudades depois de uma noite bem dormida. Ou quase. O gato peludo a acordara miante. E ela, solícita, largou o sonho que era importante e foi atrás do felino. Como sabia que era importante? Porque ficara repetindo um nome infinitas vezes naquelas formas malucas que o universo tem para sinalizar algo.  Acordou saudades e esquecimentos. Não lembrava o aviso do sonho. E logo o dia foi lhe tomando e deixando de lado as magias e mistérios que isso é coisa das madrugadas. Os dias exigem mais ação e coragens. Somos i...

Rascunho da vida cinzenta

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Amanheceu a manhã de um dia qualquer. Um daqueles que escorre devagar e vai se formando na alma da gente como gota que pinga de um remédio.  Arrastou as cobertas de supetão, mas antes correu os olhos pela tela que lhe mostrava o que tinha acontecido enquanto dormia. Deu um suspiro ao ver as notícias. Melhor ver os gatinhos que eram mais fofos e enterneciam mais que as tragédias e mesmices dos sites de imprensa. Passou por debaixo do chuveiro sem tempo para aquele banho demorado em que podia meditar. De todos os pecados inconfessados destes tempos de cobranças comportamentais, o banho era o pior. Gastava água sim. Sem remorso. Sem vergonha. Tinha lá os seus pecados.  Engoliu um café preto misturado com pedaços de pão com manteiga e saiu à rua. A rua. Cada dia mais assustadora. Tinha vezes em que se imaginava nos tempos em que as pessoas não tinham necessidade de sair dos muros e quando o faziam, eram em comboios intensamente vigiados. Mas não só os perigos de fora ...