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Mostrando postagens de outubro, 2017

Das agruras de sentir conforme a Lua

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As vezes se perguntava o que era ser mulher. Era mais que vestir rosa quando pequena ou sangrar todo mês desde criança ainda. Era mais que os não devias e os devias, limiar muito estreito que ouvia e seguia desde que se entendia por gente. Era mais que abotoar uma blusa até em cima ou desabotoar de acordo com as circunstâncias. Era sem dúvida bem mais que ser bela em alguma etapa da vida e ser disponível para ajudar em outra. Lá no fundo do seu ser se sentia mulher. Nem em outra encarnação, se existisse isso, queria voltar sem ser fêmea. Das agruras de sentir conforme a Lua, isso ela entendia. Mesmo que não tivesse parido, mesmo que não tivesse um macho para chamar de seu, ela sabia.  Que isso de nascer mulher não depende apenas de uma conjunção de combinações de óvulos e espermatozoides.  Mulher se criava nas sombrias e luminosas veredas dos universo, sob arranjo de deusas e anjas aladas que ruminavam antigas rezas para que de quando em quando, se gerasse na face

Primeiro surto, depois converso

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Acordou com o sol da meia noite. Não, não estava em um país desses de contos de fada nórdicos, seu sol real fazia o movimento normal de ir e vir nos céus com alguma variação dependendo da estação. Era dentro dela que a claridade se fazia em plena escuridão. l Uma estranheza. Apenas um quê que bateu esquisito na conversa de sempre. O dia tinha sido tão lindo que mal notou. Ou fez de conta que não notou. Ou não quis notar. Na verdade não.Tudo nela renascia e tudo nela não queria notar nada que destoasse do sol imenso que começava a brilhar por dentro. Mas....o que pipocava dentro dela. Mais que as palavras ouvidas, o tom de voz era cortante. Ou eu coisa dela? Desconfiada desde que nascera, alma fugidia dessas que se entregam com as malas atrás da porta, prontas para seguirem viagem ao primeiro senão.  Era ela. Surtava.  Mas surtava calmamente. Com classe. Com elegância.  Talvez como algumas vezes acontecia ia convergir paranoia e realidade muito tempo depois. As v

De um olhar fez-se o encontro

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Era um dia de inverno cheio de brumas. Tantas que o avião marcado às pressas demorou horas para levantar voo. Mal sabia que sua vida ia mudar em poucas horas. Por ora apenas se lamentava daquele tempo que lhe atrasava a vida. Enquanto descia as escadas da escala nem podia imaginar que um olhar a seguia. Nem quando sentou na espera interminável do destino. Sua mente divagava entre a observação de uma turma de nipônicos que faziam mil mesuras e a urgente necessidade de fazer com que a sua bagagem enfim fosse para o mesmo lugar que ela. Levantou suas pernas em meias brancas, sua saia e blusa branca. Ela toda branca não fora uma casaco cor de maravilha. Ela toda maravilhas.  Um balcão. Um olhar que a acompanhava desde a escada se faz homem. Ela desatenta nem presta atenção. Não fora o atendente mais sutil, talvez o momento não se fizesse. Uma poltrona ao lado da outra. Uma conversa como tantas outras. Um observar analítico como tantos outros. Seria nada se não fora uma fr

Palavras ao vento

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"De amar muito deixas amor em teu redor, e quem passa por perto crê que tens a rosa por dentro..." tradução livre do poema que Omara Portuondo sussurra em meus ouvidos enquanto tento me concentrar para trabalhar nessa sexta feira 13 de um chuvoso outono nesta mui leal e valorosa cidade que um dia foi um Porto Alegre. Um teste fajuto desses de redes sociais feitos com certeza para saber mais dos meus hábitos que para mim nada rendem, mas para que, unidos aos de muitos, se tornam uma das mais valiosas moedas de valor dos dias de hoje, a tal da Economia da Atenção...o tal teste me disse (na lata devo admitir) que não sou das mais tapadas, mas a procrastinação me impede de voar mais alto. Sim. E com certeza. Procrastino com consciência. Preciso desse hiato para me religar no processo criativo. Absolutamente não sou das pessoas que agem. Sou das que pensam. E o pensamento está cada dia mais obsoleto....o que me leva a admitir que sim, sou um ser em extinção. Absorvid

Homens sem noção - aborrescentes tardios

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"Criatura que não fez as bobagens na adolescência e resolve fazê-las na melhor idade..." Ouvi esta frase alguns anos atrás. Na época guardei mais como curiosidade que constatação. Mas com o rolar das páginas da vida (outra pérola que um antigo mestre de obras me brindava para falar das agruras das obras) e quanto mais cabelos brancos escondidos por tintas tenho na cabeça, mais encontro alguns espécimes peculiares de homens que fazem cantadas sem noção. E aqui uma pequena advertência, nada contra e tudo a favor de cantadas inteligentes e focadas na minha pessoa. O que acho risível e digno de pena até são os tipos que classifico abaixo: METRALHADORA GIRATÓRIA - aquele que saí atirando a esmo. Mal te conhece e já vem mandando bala. E com uma cantada que cheira a receita de bolo. E de longe já sabes que faz o mesmo com qualquer ser de saia que passe perto dele. Imagino que a sua auto estima seja tão baixa que deva espalhar sua artilharia de forma aleatória na esperança qu

Brincante das palavras

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Ando pelas ruas procurando um tal tema que me agrade e que faça as palavras saírem fáceis e faceiras. Todos parecem não fazer já muito sentido. Nada parece fazer muito sentido.  Eu já não faço sentido. Quando a vida perde seu foco de nos permitir a busca de nossas necessidades  básicas, entre elas a felicidade. ( e já parei várias vezes de escrever para t apar buracos de carência de alguém que também largou mão de seu foco para cuidar dos outros). E isso me leva a refletir que a vida não só é uma troca e só vale a pena se assim fôr(mania de tirarem os acentos diferenciais, for é muito esquisito, prefiro o errar com circunflexo. No fundo tenho alma rococó) como também nos pede respostas ao nosso próprio foco interno.  Não sei se muitos já conviveram com pessoas mais velhas, bem mais velhas, naquele período em que já estão mais lá que aqui, e mesmo as mais gentis e educadas, sempre se tornam mais imediatas. Querem o que querem JÁ. E o que querem? Atenção. O que quere

Todos os caminhos convidam e eu mergulhei

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Confesso a vocês que li algumas resenhas depois de ler de uma sentada só o primeiro romance de Cinthia Kriemler . Seu nome? Todos os abismos convidam para um mergulho. Já venho acompanhando a obra da Cinthia desde que a redescobri naquela rede social que a gente reencontra amigos de outras eras. A Cinthia pré adolescente que eu conhecera não só crescera como se tornara escritora. Ora vivas! Para uma leitora voraz como eu nada mais instigante. E não é que era das boas! Seus poemas e contos me tomavam de assalto, tinham ritmo não só das palavras e frases bem construídas, mas faziam a minha mente de arquiteta viajar pelos espaços que ela criara. Quando soube do seu primeiro romance tive que mergulhar. Pela primeira vez. Quando o livro chegou li em um dia e meio. E porque tive que parar para atender outras coisas. E já concordo com todas as resenhas que li: não é uma leitura cômoda. Mas é inebriante.  No começo fui tomada pela sensação que a contadora de contos (perdoem a r

Uma história de fim de tarde

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Era tarde. Pelo menos parecia que era. Não que fosse importante mas já corria o meio da tarde e urgia que corresse se quisesse saber a resposta. Nesses dias meio assim, sem som, sem chuva, em que a vida parecia correr sem pressa e sem graça, as urgências perdiam sua necessidade. Talvez fosse bom. Vá lá se saber. Correu os olhos pelo armário. Entulhado de roupas que um dia lhe serviram. Devia se livrar delas de uma vez já que não conseguia fazê-las caber em seu corpo. Colocou a mesma calça que lhe dava a harmonia das coisas conhecidas, uma camiseta mais básica e um sapato confortável. Disso não abria mão. Já aprendera que a vida é muito curta para bolhas nos pés. Abriu a porta e foi. Antes uma gota de perfume e um batom ligeiro que mesmo na pressa não urgente havia lugar para alguma vaidade.  Ligou o carro com a calma das rotinas. O rádio na mesma estação. AM que noticia lhe deixava mais atenta que música. Olhou rápido para o relógio. Mentalmente fez as contas. Sim, dava tempo. Detestav