Postagens

Mostrando postagens de fevereiro, 2023

A vida sempre continua

Imagem
  Acordo mais tarde e já vou caminhar com o dia corrido nesta quarta-feira de cinzas onde a cidade adormecida recomeça a voltar sua vida de todo dia. Faço uma meia volta no parque, ladeando uma avenida cheia de árvores e um corredor de ônibus central. Enquanto olho o movimento no meio das árvores ouço um som que mexe comigo. Uma sirene de ambulância.  Já estive dentro de uma, correndo pelas ruas escuras da cidade, enquanto meu pai recebia atendimento e eu rezava para que tudo desse certo e chegássemos a tempo no hospital. Se antes eu já sentia aquele barulho como urgente, agora ainda mais. Sempre rezo para que tudo dê certo para quem ali dentro luta pela vida.  Olhei para o lado e, no corredor de ônibus, vejo três veículos. Um ônibus na mão normal. Uma ambulância com sua sirene tocando na contra mão. E na frente dela, outro ônibus em sua rota. Fico imaginando que um dos ônibus vai se mexer, ou os dois para que a ambulância siga seu caminho, duas quadras que está do pronto-socorro munic

o homem dorme abraçado ao seu cachorro

Imagem
O parque onde costumo caminhar estava hoje mais vazio do que o costume. Um sol bonito acalmava a cidade depois de um dia muito chuvoso. De certa forma os quase 13 graus da manhã de sábado são um alívio para corpos e mentes cansadas. Pessoas caminham, a turma dos cachorreiros conversa com seus cães que brincam distraídos. No fim do espelho de água, uma mulher bem agasalhada fotografa. Na sua frente, parecendo um quadro, um homem dorme abraçado ao seu cachorro. Ao seu lado um carrinho, mistura de plásticos, lixos, embalagens vazias de eletrodomésticos e bens de consumo que ele, com certeza, nunca terá. Mas ele tem seu cachorro. E dorme abraçado com ele. A mulher cheia de agasalhos para um dia de verão mais fresco, tira várias fotos com seu smartphone de última geração do homem que dorme no meio do gramado. Não deve ter uma casa. Se tiver, talvez seja longe e não teve tempo, talvez nem energia para caminhar com seu carinho cheio do descarte de outros. Outros como eu e a mulh

Em outros carnavais quando a vida era mais solta

Imagem
Diálogo entre Antônia e sua cuidadora, em um quarto de uma clínica de repouso. Antônia tem 95 anos e sua cuidadora, Dora, vinte. - Seus remédio, Antônia. A pílula rosa é para a pressão, a branca para o colesterol, a amarela para a ansiedade, a rosa para afinar o sangue, a comprida para a memória. - Memória? Brincas comigo. Fora! Memória é bom para gente jovem como tu, que tem futuro pela frente, que precisa lembrar de quase tudo o que fez. Para repetir ou se arrepender. Quando se está velha como eu,  melhor nem lembrar que dia é hoje e quanto tempo falta para morrer.  -Deixa de bobagem! Falando nisso, sabes que dia é hoje? 20 de fevereiro de 2050. Domingo. Na tua época era carnaval, Antônia! Vai dizer que tu não gostava de comemorar a folia? Ouvi dizer que eram grandes festas populares no século passado. Minha mãe disse que se lembra ainda de bailes infantis onde ia fantasiada de uma coisa chamada de mulher maravilha. Devia ser algum avatar da época. Ela falou daquele parque

olho que tudo vê e escuta (divagações de um feriado)

Imagem
  Quinta feira que parece sábado em mais um feriado de Nossa Senhora dos Navegantes, ou simplesmente Navegantes como se diz em Porto Alegre. Dia calorento e enevoado. Desde ontem um abafamento que prenuncia tempestades. Só prenuncio por enquanto. Como as mensagens da defesa civil que pipocam no meu celular avisando de risco de tempestades. Esqueço que devem ser para várias regiões e que chuvas de verão, em geral, são localizadas. Então apenas sinto o bafo, me protejo como der. Me divido entre ligar o ar condicionado e temer a conta no fim do mês. Ou abrir a janela e me sentir mais perto do inferno. Um feriado na quinta, em pleno verão, faz com que as pessoas sumam da cidade. Detesto este ar de fim de festa. Parece filme de faroeste quando o bandido vem e todos se escondem, fica apenas um cachorro sarnento e um galho seco que teima em correr pelo chão poeirento antes que os cascos dos cavalos entrem na cidade. Aliás detesto faroestes. Faroestes. Abrasileiramento de Far west. Oeste di