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Mostrando postagens de novembro, 2019

Papai Noel, vê se você tem a felicidade pra você me dar

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As tradições. De onde vem os rituais que repetimos anos após ano, aprendemos em nossa infância, levamos para a vida adulta. Por vezes mesclamos com os rituais de pessoas que vamos somando na vida. Lá em casa os Natais eram festas grandes. O pinheirinho nunca podia ter este nome porque eram, em geral, arvores de quase três metros, cortadas especialmente para a ocasião. Lembro de ir comprar e ver aquela fila de pinheiros, uns maiores, outros menores, esperando para serem levados às casas, enfeitados, saudados, festejados como símbolos de fé e renovação. E depois jogados fora, já despidos dos verdes e transformados em lixos secos. E os coitados que nem escolhidos eram, ficavam ali mofando, em uma morte inglória porque nem serviram para algo. Tipo muita gente que passa pela vida sem sentido e morre sem mais ainda. Filosofias à parte, o pinheiro era engalanado na sala. Apoiado por uma estrutura de caixas com pedras para que ficasse bem firme. Era a hora mágica de trazer os enfeites b

Passageira

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Eu que tinha tantas certezas absolutas Hoje sou só dúvidas Perplexidades talvez fosse melhor definição Olhos abertos e ouvidos moucos Corpo cansado Não quero mais  Saudades de um tempo de sonho Vontade de quero mais Não portas que se fecham mas horizontes em flor Quero clichês Quero perfumes de cítricos quero mãos me descobrindo quero arrepios  e risadas dor de cotovelo e bolero miando pernas entrelaçadas mãos bobas/espertas me alertando que a vida urge Quero futuro pela frente Quero brincar com minha amiga e dizer que a vida vai ser bonita que isso tudo é só um pesadelo que vamos acordar ainda adolescentes fazendo dietas malucas contando historias  imaginando paqueras vestindo roupas novas para a saída de sábado Agora as portas se fecham não quero dizer adeus não quero entender não quero sofrer Minhas certezas, mesmo as sectárias, me davam firmeza  a certeza da solidão que me aguarda me fragiliza a vi

Longe de mim e fora dos trilhos

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Escrevendo para fazer sentido, Lindevania Martins, transcende seu mundo e descreve o universo feminino com uma mistura de crueza e poesia. Desde sempre seus escritos me cativam pela musicalidade das palavras. Com Longe de Mim , um conto que participa de uma coleção Brasil/Argentina e Fora dos Trilhos , poesia do mulherio das letras, não é diferente. Ela transita entre a prosa e os poemas com a delicadeza das mulheres que se constroem com firmeza e doçura. Fora dos Trilhos   Um livrinho. Não Um livro que traz densidade Das pílulas de memória para épocas de desamor às microssagas microfônicas que brincam com as palavras iniciadas com a mesma letra "dos fantasmas que matei  não guardo remorsos uma ou outra faca e nada mais"   Da poesia da Lindevania, mulher maranhense  atuante, defensora, escritora não se espere a rima fácil nem a candura da feminilidade clichê Ela nos oferece armas lutas escaramuças paixão feito carne e bicho s

Todo dia ela fez tudo sempre igual

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Todo dia ela fez tudo sempre igual, acorda de madrugada, pega o tablet só de hábito e quando se dá conta, são horas desperdiçadas no nada. Notícias daqui e dali que não ajudam a formar uma ideia lógica do mundo desconexo onde habita. O que sobra são um resquício de sono, umas olheiras que serão disfarçadas com base e iluminador. E muito café. Todo dia ela jura que vai focar. Vai arrumar os cacos da vida que um dia imaginou plena. Vai fazer como aqueles programas de TV onde se colocam três baldes: um vermelho onde vai jogar tudo o que não presta mais, um amarelo onde talvez quem saiba, e outro verde onde sim.  Todo dia jura para sim mesma que o vermelho vai estar transbordante, que assim do nada vai virar minimalista. Que vai se livrar dos entulhos, dos restolhos, dos encostos.  Todo dia ela acaba não fazendo nada disso.  Todo dia ela senta em frente a uma tela, imaginando que vai brotar a velha inspiração e as palavras vão germinar feito sementes em terra adubada. Só que não

Tic Tac que não para

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porra de vida, pensou baixo seu tempo se esgotando a vida se ajeitando a família já vivendo a expectativa do não ter não mais eu a vida é uma grande merda, na verdade tenho vida meu sangue ainda corre nas veias cheias da quimio meu cérebro ainda pensa no meio do tumor que o corrói o tic tac maligno canceroso implacável vai me tornando algo tão diferente do que sou minha alma ainda a mesma tento dizer aos que amo vejo nos seus olhares medo pena o choque da imprevisibilidade Todos temos data de validade porque a minha tão cedo? tantos sonhos tanto amor tanta esperança tudo adiado para sempre porra mil vezes porra melhor cerrar os olhos não pensar voltar Para onde afinal? Descartável o que sou um corpo que não reconhecem uma agilidade que falta um outra eu a mesma eu maldito relógio!

A travessia da velha senhora

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Catarina estava com sono e sem paciência naquela manhã em tudo invertida. Saíra apressada de casa para uma reunião daquelas do trabalho, onde todos falavam muito e decidiam pouco. Foi com um sonoro palavrão que brindou o sinal fechado na faixa de pedestres. Já ia colocar o pé apressado no pedal quando viu. José estava feliz. Tinha sido recém promovido. Comprara o carro novo, tão sonhado, e o anel de noivado para Joana. Ela não sabia, mas ia ser pedida em casamento naquela noite. José tinha temperamento romântico e gostava de adivinhar os desejos de sua amada. Estava conjeturando se tinha acertado nos inúmeros detalhes que tornassem a data inesquecível que só se deu conta, quando distraído, olhou em frente. Julieta tinha saído de casa, como todas as manhãs fazia. Ia comprar o pão no super mercado para tomar um café gostoso, com requintes de cuidados que fizera por mais de oitenta décadas. Seus cabelos brancos em um coque arrumado. Seus dedos, antes ágeis, meio entorpecidos pe

Uma carta para o passado

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Minha querida Elenara ainda nos primeiros anos de sua/nossa vida, te vendo assim sorridente, o que não era habitual, nessa foto de 1958, fico aqui imaginando o que motivava a alegria nos teus olhos e te imagino naquele andar cambaleante dos que se aventuram por este mundo, ávidos de descobri-lo.  Sempre fomos curiosas.  Nossa eterna mania de perguntar além e além já era meio inata, devia vir no DNA de gente que nos precedeu. Do nosso quartinho no meio do corredor e que tanto nos marcou pela falta de privacidade.  Privacidade e curiosidade seriam nossas marcar indeléveis.  Crescemos entre acenos à liberdade e o medo de nos expor ao mundo. Uma confissão, minha pequena loirinha de olhos quase pretos: isso nunca mudará, não importam as leituras e terapias. Talvez os suplementos de B12 tenham ajudado um pouco. Talvez seja a maturidade chegando e nós tenhamos que achar uma explicação lógica. Como sempre. Vamos sempre nos amparar na lógica. E no delicado equilíbrio en

Ajuste de contas

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A fome apertava enquanto a manhã corria. Nem se dera conta das horas passando e já chegava perto do meio dia. O café bebido às pressas ainda na madrugada há muito já tinha sido digerido. Não importava. Logo tudo teria termo. Suava enquanto corria as mãos pelas roupas, imaginando qual a mais adequada para caber em uma mala pequena. Era tudo o que levaria. Toda uma vida se resumiria em duas calças, duas camisetas, um vestido e poucas roupas de baixo. E um livro. Nada mais sobrava da vida. Seus amores que tantas emoções lhe rendera, como na música do Roberto, ficariam na lembrança dos tempos de vida. Os trabalhos amarrotados na vida se juntariam ao cansaço de recomeçar. Ela toda cansaços. Ela toda amassos. Ela toda apenas uma minúscula poeira de alguém que um dia tivera sonhos de quimeras. Adolescera. Adoecera. Agora se ia.   O gato miava solitário em um corredor da madrugada. Alguém gritou reclamando que a cerveja estava quente. Um ambulância cruzou a noite com a sua siren