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Mostrando postagens de agosto, 2024

Quem Fala por Mim?

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Pequena fábula em forma de crônica baseada em fatos ouvidos e narrados por pessoas que viveram. Dona Clara tinha 77 anos. Era daquelas mulheres que mantinha-se firme, lúcida e ativa. Acordava cedo, lia o jornal todo, e adorava um bom debate sobre os rumos da política e da ciência. Se havia algo que nunca lhe faltara, era a clareza de pensamento e a vontade de viver a vida plenamente. Casada com o João, um homem 20 anos mais novo, Clara se divertia com a diferença de idade. Ele, aos 57, vibrante e carismático e ela que, com sua calma e sabedoria, equilibrava a casa. Tinham uma vida feliz, ainda que cheia das piadas maldosas que escutavam sobre a diferença de idade. “Ele é quem cuida de você, não é?”, diziam uns. Clara apenas sorria, paciente, mas lá dentro, revirava os olhos. Certa vez, começou a sentir algumas dores no joelho. Algo pequeno, uma pontada ao caminhar. “Ah, coisa da idade”, pensou, mas mesmo assim resolveu ir ao médico. Chamou João para acompanhá-la, só para não ficar sozi

Palavras ao vento

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Granito pedra carregada de longas conversas mal desfeitas Julgo Embora nasça a cada dia,  ainda sou alma velha das mágoas da infância Mereço Guardo em minha alma as palavras/tantas;  mal ditas Renovo a cada momento um olhar ferido e caústico sobre o mundo e as feridas Lambidas Amargas como o grito contido Navego águas turbulentas e represadas Guardo malas de memórias que já não são minhas Sou repositório de olhares femininos que percorreram mundos Nasço Com vivendo com fomes ancestrais Urro porque fera Fecho os olhos porque domesticada Cassandra de palavras moucas Percorro minha sina de solitária marcha Um dia te percorro No outro te deliro Em ambos me procuro Um dia me/te acho

Eterna equilibrista entre o real e a magia

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  Mulher intensa Não sou Não tenho este ímpeto de loucuras Sou das planícies do pé no chão Não me fascinam voos perigosos nem os adrenaliticos acenos da vida que passa urgente e ligeira dos atropelos dos dias de chuva  equilibrista entre Bethania e o transito cavalgando nas paixões de ontem,  de hoje, de sempre entre uma buzina e uma granola assobiando cabelos grisalhos com a ventania das fomes e a calmaria das dores de um joelho que teima em lembrar dos cartórios Pise no meu coração, grita a música A mulher não intensa que sou sorri e concorda em termos metafóricos ciente que a realidade convive com gentilezas e sutilezas apenas Fome real saciada, restam as ânsias de magia de todo dia adormecidas na poesia de uma sexta gris Monótona e cheia de promessas Entre o café e o vinho Fico com os dois

A busca pela resposta

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Números significam algo? Uma data que uma convenção qualquer nomeou que hoje é 18 e não 525,28 faz alguma diferença em minha vida? Ou é a eterna mania de encontrar significados nas coisas. Diz que tem nome para essa coisa do cérebro tentar achar formas e conceitos familiares para que a vida faça algum sentido. Especialmente quando não faz. Fazer sentido. O que seria? O que é para mim pode não ser para você. Cada um de nós é um universo em formação colidindo com outros universos, nós todos indo ao encontro de uma nebulosa onde enfim pereceremos em um grande BUMMM. Ou encontraremos um buraco negro que nos leve à outros universos onde repetiremos a mesma viagem. Ou talvez encontremos o nirvana. O Nirvana. Não a banda. O paraíso encantado onde não existe perguntas e cessa o sofrimento essencial de não se saber o que se é. Sim, porque seres humanos passam a vida tentando se achar. Alguns pelo menos. Os mais interessantes pelo menos. A busca. A ânsia de chegar a algo. Este algo é diferente p

Saindo do casulo

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Vivi vidas em casulos Ninhos de solidões e aconchego mistura de abrigo e esconderijo A maturidade me trouxe voos Os desafios de enfrentar medos escusos De repente tudo iluminado como se caminhar  fosse a sina aprendida em tenebrosas lições passadas Passadas Vida que se renova em  emoções lições traições renovAÇÕES  

carta a amores verdadeiros

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Imersa na releitura de Tudo por Amor de bell hooks me deparo com um trecho de uma carta não enviada para um dos seus amores verdadeiros. Vários sinais piscaram no meu cérebro e coração: cartas não enviadas, conheço e muito. São várias em minha vida, principalmente em um tempo onde a comunicação de sentimentos se escondia sob toneladas de proteções, muitas baseadas em achismos e carências. Amores verdadeiros é outro termo que demorei para entender o real significado. Confundia os amores possíveis com os verdadeiros. Confundia vontades minhas com a reciprocidade. Confundia defesa interna com falta de amor externo. Tantas confusões que marcaram minha vida e me fizeram também essa eu de agora. O trecho da carta de bell hooks dizia:      "Somos muito mais capazes de abraçar a perda de pessoas íntimas que amamos ou de amigos quando sabemos que demos a eles tudo o que podíamos – quando compartilhamos com eles o reconhecimento mútuo e o pertencimento no amor que a morte jamais poderá muda

O mate e a impermanência da vida

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Acordei filosofias de galpão. A vida, tal qual um mate bem cevado, tem seus ciclos. A água quente transforma a erva verde em uma bebida revigorante, mas, acaba por esfriar e perder o sabor. Assim também somos nós. Vivemos intensamente, buscamos calor nas relações, nas experiências, mas tudo tem seu tempo. A juventude dá lugar à maturidade, e esta, à velhice. Nada permanece igual. Era uma tarde de domingo em Porto Alegre, daquelas cinzentas que parecem encurtar o horizonte. Os pensamentos se alongam e cavalgamos coxilhas como tauras desbragados. O Parque da Redenção, com suas árvores já divididas entre os galhos secos do inverno e as flores teimando em anunciar uma primavera precoce, oferecia um cenário perfeito para a reflexão. Sentei-me em um banco, próximo ao lago, e comecei a preparar meu mate, observando as pessoas que passavam com suas vidas apressadas mesmo sendo um dia dedicado ao descanso. A vida sempre me ensinou a apreciar esses momentos de calmaria. A maturidade, assim como