Amando na nuvem
Girou o cálice de vinho nas mãos, pensando que, puta merda, acabou sozinha justo quando irrompeu a maior pandemia do século, quiçá do milênio.
Trinta anos de casamento, outros tantos de namoro. Filhos criados, netos nos fins de semana e inventaram de mudar de rumos. Os dois.
Não era ruim. Mas também não era mais maravilhoso. Enfim, estava feito. Era fácil disseram as amigas já separadas. Sair na balada, olhar para os lados na academia. Tinha uma que tinha achado o namorado em uma corrida no parque.
Mas sem poder sair de casa. As redes sociais ainda em comum com o falecido. Restava então apelar para os tais aplicativos.
Outra amiga, a mais jovem e descolada, sussurrou que funcionava sim.
Pronto. Instalado no smartphone que era tão esperto que até para achar um benzinho servia. Benzinho...era assim que se falava nos anos 70, tão luz negra, tão Bee Gees, tão musica lenta ou discoteca. Agora era ficante, segundo a filha, que falara piscando o olho para que o irmão não ouvisse que, afinal, por mais moderno que fosse, mãe ainda era mãe. Não devia se prestar para tais coisas.
Perfil feito. Pensou muito na foto a colocar. Primeiro impulso foi colocar uma do dia a dia. Não adiantava impressionar e depois decepcionar. Raciocinou que eram tempos de marketing. Aquela do filtro com luz amarela era melhor. Levemente safado o sorriso, os olhos prometendo. Vai. Foi.
No início parecia estranho, mas logo achou até engraçado aquela coisa de escolher assim como se escolhe fruta no mercado. Dois toques e alguns matches depois, estava com cinco opções. Mais que nos tempos de solteira e adolescente.
Dois jovens com idade para ser quase neto. Este quase mas não, não deixava de ser uma possibilidade. Dois casados de meia idade com desejos de meia tarde. Um mais ou menos da sua idade. Nem bonito, nem feio. Talvez.
Tentou. A conversa era boa. Os dois recém descasados. Ela por tédio, ele pela morte da esposa. Os dois solitários querendo abrir portas, mas não despencar. Santa quarentena! Não precisava encarar um face a face assim de cara.
Muitas conversas. A nuvem por testemunha. Um interesse crescente. Um sorriso nos lábios. Já sentia falta da hora da conversa diária. Que se estendeu para o papo com voz. Depois com vídeo. Sem surpresas. Eram exatamente o que o outro esperava. Talvez fossem até mais pelo brilho no olhar.
Combinaram jantares, cada um na sua casa. Ela em Porto Alegre, ele em uma pequena cidade da Toscana. Brasileiro que foi pego pela pandemia em um curso de línguas que fora fazer depois do acontecido.
A distância mais que empecilho, foi caminho. Dava para se abrir sem perigo. Toma tenência, mulher, que zelo demais foi a ruína do seu casamento. Se joga. Vai. Voa para a nuvem.
Voaram os dois. Armadilhas da pandemia que isola, mas também tece encontros. Basta estar aberto para a vida que continua.
Trinta anos de casamento, outros tantos de namoro. Filhos criados, netos nos fins de semana e inventaram de mudar de rumos. Os dois.
Não era ruim. Mas também não era mais maravilhoso. Enfim, estava feito. Era fácil disseram as amigas já separadas. Sair na balada, olhar para os lados na academia. Tinha uma que tinha achado o namorado em uma corrida no parque.
Mas sem poder sair de casa. As redes sociais ainda em comum com o falecido. Restava então apelar para os tais aplicativos.
Outra amiga, a mais jovem e descolada, sussurrou que funcionava sim.
Pronto. Instalado no smartphone que era tão esperto que até para achar um benzinho servia. Benzinho...era assim que se falava nos anos 70, tão luz negra, tão Bee Gees, tão musica lenta ou discoteca. Agora era ficante, segundo a filha, que falara piscando o olho para que o irmão não ouvisse que, afinal, por mais moderno que fosse, mãe ainda era mãe. Não devia se prestar para tais coisas.
Perfil feito. Pensou muito na foto a colocar. Primeiro impulso foi colocar uma do dia a dia. Não adiantava impressionar e depois decepcionar. Raciocinou que eram tempos de marketing. Aquela do filtro com luz amarela era melhor. Levemente safado o sorriso, os olhos prometendo. Vai. Foi.
No início parecia estranho, mas logo achou até engraçado aquela coisa de escolher assim como se escolhe fruta no mercado. Dois toques e alguns matches depois, estava com cinco opções. Mais que nos tempos de solteira e adolescente.
Dois jovens com idade para ser quase neto. Este quase mas não, não deixava de ser uma possibilidade. Dois casados de meia idade com desejos de meia tarde. Um mais ou menos da sua idade. Nem bonito, nem feio. Talvez.
Tentou. A conversa era boa. Os dois recém descasados. Ela por tédio, ele pela morte da esposa. Os dois solitários querendo abrir portas, mas não despencar. Santa quarentena! Não precisava encarar um face a face assim de cara.
Muitas conversas. A nuvem por testemunha. Um interesse crescente. Um sorriso nos lábios. Já sentia falta da hora da conversa diária. Que se estendeu para o papo com voz. Depois com vídeo. Sem surpresas. Eram exatamente o que o outro esperava. Talvez fossem até mais pelo brilho no olhar.
Combinaram jantares, cada um na sua casa. Ela em Porto Alegre, ele em uma pequena cidade da Toscana. Brasileiro que foi pego pela pandemia em um curso de línguas que fora fazer depois do acontecido.
A distância mais que empecilho, foi caminho. Dava para se abrir sem perigo. Toma tenência, mulher, que zelo demais foi a ruína do seu casamento. Se joga. Vai. Voa para a nuvem.
Voaram os dois. Armadilhas da pandemia que isola, mas também tece encontros. Basta estar aberto para a vida que continua.
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