Civilização do amor: Começa em cada gesto

 

Carta de Bom Principio



Enquanto subia a ladeira meio íngreme, ladeada por casas populares e comércio de bairro, pensava em como seu avô Bartholomeu estaria satisfeito. Vinha de um encontro com um grupo de pessoas idosas em um Centro Social Marista.

No coração do bairro Mario Quintana, em Porto Alegre, o Centro Social Marista Santa Isabel (Cemasi) pulsa como uma parceria viva entre as Irmãs Franciscanas e os Irmãos Maristas. Referência para diversas comunidades da região, o Cemasi atua em um território marcado por desafios históricos e sociais — onde faltaram políticas públicas, mas sobrou potência coletiva.

Quadras de esporte, cozinha comunitária, salas de encontro e reunião compõem o espaço para que crianças, adolescentes, adultos e pessoas idosas possam usufruir dos eixos estruturantes dos Centros Sociais da Rede Marista: Cuidado, Cultura da Solidariedade e Paz, Protagonismo e Cidadania, e Incentivo à Aprendizagem Escolar. Esses eixos, segundo o site, têm como objetivo contribuir para a construção de uma “civilização do amor”.

Foi o anseio por uma civilização erguida sobre o amor, e o desejo ardente por um ensino que iluminasse mentes e corações, que moveram a comunidade e as autoridades eclesiais a se reunirem, em 1900, para redigir o apelo que viria a ser conhecido como a Carta de Bom Princípio. 
Entre aqueles que, com fé e esperança, assinaram o chamado, estava um jovem professor — filho da Alemanha distante, transplantado ao solo brasileiro em 1873, junto de seus pais e irmãos. Seu nome era Bartholomeu. Meu avô. Uma voz jovem a soprar futuros no vento.


Os colonos enfrentavam situações adversas, muitas vezes distantes das promessas feitas pelas autoridades brasileiras ao atrair populações rurais empobrecidas do recém-criado Império Alemão.

Mas, mais do que a história familiar ou da imigração, o que me emocionou foi perceber como tantas vezes ações feitas em determinado momento da vida frutificam de maneiras que nem imaginamos. Aqueles colonos queriam um futuro melhor para seus filhos e netos — e muitos nem chegaram a ver os frutos de suas escolhas.

E assim acontece conosco.

Plantamos sementes que talvez nunca vejamos florescer. Uma árvore cujos frutos não comeremos. Uma palavra dita com carinho que muda uma vida. Um professor que deixa saudades pelo trabalho que fez e marca vidas — infantis e já bem idosas — como as saudades e elogios que ouvi de senhoras para um mestre que deixava o grupo para assumir outro posto.

Já contei aqui sobre uma senhora que se autointitulava doadora de sorrisos. Ela andava pelas ruas distribuindo sorrisos — artigo em falta nos dias de hoje.

Quantas ações, mesmo pequenas e despretensiosas, fazem diferença na vida de alguém?

É o bolo de cenoura da avó que marca a memória da neta. É a mão do pai que segura a bicicleta. É o exemplo de vida. É a atitude de hoje que molda o amanhã.

Enquanto subia aquela ladeira, me emocionei ao imaginar o quanto aquele avô — que só conheci pelas palavras de minha mãe e tias — ficaria orgulhoso de saber que seu sonho de um futuro melhor estava gerando tantos frutos.

É assim que se constrói uma civilização que vale a pena: humana, generosa, participativa. Cada um fazendo o seu melhor, contribuindo para que o jardim da existência receba adubo, água e oportunidade para florescer para muitos.

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