Era dia de qualquer hora e ela mesma, mulher de qualquer momento. Nem sabia mais que idade tinha ou qual era a motivação que fazia seus dias diferentes da mesmice de qualquer tempo. O tempo corria célere. Isso ela sabia. Ainda ontem era dia de brincar de roda. Vestida de baiana, balangandã na cabeça saia dançando como se o amanhã não existisse. Existia. Hoje vivia o amanhã. Seu corpo doía. Sua alma sentia uma solidão difícil de explicar. Era dela mesma que sentia falta. Era dia de qualquer momento e ela mesma, mulher de qualquer hora. Seu documento gritava uma dezena de anos que não lhe pesavam por os ter vivido. O peso vinha quando pensava que o tempo que restava era bem mais curto. Talvez, com sorte, a metade. E já sabia da ligeireza das horas. Vestida de banalidades, bebia água que nem era mais cristalina, e sabia a aromas de campo. Tinha gosto de alecrim. Cheiro de canela. Sorria. Ouvia Paralamas, quase um segredo e pensava sim. Expectava o que viria a seguir. Seria tempo de ...
Caminho no parque em um dia ensolarado. Passo pelo Capitão América, de escudo no braço, passo triste de quem não consegue vencer todos os compromissos. A mochila nas costas, mal ajeitada, não me diz se o mundo será salvo. Duas amigas param no sinal, debatendo sobre a grave situação educacional. Como a sinaleira fica verde, perco alguma possível solução. A mulher de voz enrolada e ar desgrenhado de quem mora nas ruas, pede um favor porque, segundo ela, hoje é seu aniversário. A vizinha de 90 anos atravessa a rua deserta em um domingo pela manhã. Penso que não tenho a sua coragem de usar bolsa em uma cidade cada dia mais perigosa. Para mulheres, pessoas idosas e quem mais não se enquadre na sociedade. Recortes de vidas. Quantos destes momentos nos marcam de formas tão intensas. Os que vemos, os que participamos. A vida também é feita desses pequenos retalhos “sobre tudo o que nos interessa, nos comove, nos impressiona, n...
02/10/24 É o segundo dia do décimo mês do ano de dois mil novecentos e vinte e quatro. Escrito assim parece mais pomposo e solene. É uma mera convenção. Podia ser colibri dourado do mês abundante de flores do ano da colheita do que se plantou. Tudo na vida é convenção e esta é construída pelas nossas visões, nossos aprendizados e o que aceitamos como verdades. Existem fatos. É dia, tem nuvens no céu, vai haver eclipse do sol. Existem crenças e sentimentos oriundos delas. As nuvens empanam o brilho e o eclipse marca portais de energia cósmica que podem afetar seres que habitam um planeta qualquer da Via Láctea que tem o sol como estrela geradora de vida. Dito assim até parece fazer sentido. O que faz sentido realmente na vida? O que vemos? O que filtramos do que vemos? O que sentimos do que filtramos do que vimos? Filosofar sobre o sentido da vida sem citar ninguém e em plena manhã de uma quarta cinzenta, sendo apenas uma janela na imensidão de prédios que compõem minha cidade, f...
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