Retrospectiva do futuro
Uma folha em branco. Já se disse coisa mais clichê que isso para representar a falta de criatividade? Ou de paciência? Ou de pura exaustão mental e emocional?
Uma folha em branco e nada para dizer.
Não pela falta de assunto, mas pelo acúmulo.
Suspirou ao se dar conta que não conseguia mais entender o mundo. Era um tal de conceitos embaralhados, onde as certezas pareciam se desfazer como farinhas nas suas mãos.
Só apelando para uma estética auto "ajudatória", dessas inspiradas em caminhadas de auto conhecimento, onde a imensidão das pradarias e as bolhas nos pés substituiriam filosofias mais cheias de consistência.
Trocar o analítico pelo sentimento. Parecia uma bela fórmula de sobrevivência no novo milênio.
Quanto mais lugares comuns, menos tempo para decifrar e mais leitores curtindo. Já imaginou dialogar sobre filósofos em redes sociais? Explicar conceitos densos em 140 ou 270 caracteres? Quem ia lá se importar quando até mesmo decisões políticas importantes eram tuitadas e se disputavam "hashtags" com exércitos de militantes e robôs como se fossem uma batalha real.
Seus olhos pulavam da janela, onde o calor escaldante revelava um verão inclemente, para a tela do notebook, cada vez mais vazia que pareciam espelhar seus sentimentos.
Se sentia oca como as teorias da terra vazada que lera quando quase adolescente, tanto tempo atrás, que nem lembrava mais. Era uma teoria doida que os nazistas acreditavam existir lá pelo Tibet. Pelo menos era o que lembrava. Na época, década de 70, era tudo um desbunde e a geração paz e amor gostava de pesquisar possibilidades enlouquecidas. Depois deles vieram os enlouquecidos por trabalho, os enlouquecidos pela tecnologia, os enlouquecidos pelas curtidas de tanta gente que seria impossível conhecer fisicamente em uma vida. Em comum tinham o enlouquecimento.
Não é que agora apareciam uns remanescentes daqueles épocas de teorias conspiratórias que acreditavam nas explicações literais da criação e na tal da terra plana. Acham graça? Tinha recebido mensagens privadas de gente que acreditava nisso. Afinal teorias de evolução são apenas teorias, se fossem certezas seriam leis, era o que diziam.
Temia que chegassem tempo em que os romances distópicos que lia se tornassem reais. Onde a vida se tornasse um grande livro em branco. Livro não, que eles podem indicar caminhos que afastem das leis religiosas. Telas em branco.
Uma vida de clichês. Seria isso que o futuro reservaria?
Quem viver, se viver, verá
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