Da voragem que rola sem seiva

Momento de vivência
tolhendo carências de não viver.
Sementes jorradas
escolhas perdidas
na imensa ausência do bem-querer.

Mistura líquida de sorvete e menta quentão.
Quente que queima a língua.
Feio que traz frio que mata.
Angústia do não sair.

Da palavra que morre antes de nascer.
Da voragem que rola sem seiva.

Da mata. Da rata. Do nada.



Entre o friozinho de 12 graus que me chega pelas costas, vindo da janela aberta que renova o ar do quarto dormido e o gole do segundo copo d'água da manhã, sinto meus dedos não tão ágeis correrem pelo teclado numa tentativa de retomar um velho hábito de vida: escrever.

O prazer de colocar no papel algo meu. Quando despertado? Lembro da minha vó escrevendo as palavras de saudades que ditava para meus pais que tinham viajado a passeio. A fascinação da eu pequena de uns três ou quatro anos de ver que meus sentimentos iam se materializar via correio e iam chegar ao seu destino.

As redações do primário, sempre elogiadas pelos professoras. Já fruto de muita leitura. No início narrada pelos outros: pais, primos, irmã. Depois a descoberta que a união de letras faziam sentido e as frases jorravam das revistas e livros para meus olhos e mente que liam com sofreguidão. As aulas de gramática, sempre odiadas, mas salvas pelo saber criar frases lindas com tempos verbais de nomes esquisitos.

Na adolescência, os diários. Pueris, ingênuos, eivados de chorosas carências. Mas escritos com criatividade de imagens e verdades. Os primeiros poemas e contos. Os prêmios ganhos que me fizeram achar que era um talento nato. Ledo engano! A vontade era sim, nata. O talento nem tanto. Mas de que servem as ilusões senão para que continuemos a caminhar? No caso, a escrever.

Escrever virou quase terapia. Era uma conversa interna, externada por palavras e mostrada para poucos em um mudo grito de atenção. Uns elogios nem sempre tapavam os buracos da alma, mas serviam para cada dia. Mais um pouco. Mais uma horas. Mais uma vida.

E lá ia para páginas datilografadas que guardavam meus tesouros. Depois a descoberta dos blogs. Que riqueza! Escrever para mim e espalhar ao mundo. Ali desnuda para quem quisesse descobrir.

A vontade carente de ler para àquelas pessoas especiais, como uma oferenda. Descobrir que bem poucas olhavam para meus baús de memórias com olhos de atenção genuína. A maturidade ensinando que não importa se ninguém lê, mas o jorrar faz diferença. A força interna de desabafar e jogar para fora o entulho que atrolha a mente. Cavar espaço para novos acúmulos, refeita do descarte necessário a cada dia. Ou momento. Ou vida.

Escrever é catarse. Às vezes. Nem sempre. Outras é puro exercício de disciplina. Ou de prazer. Redescobrir o prazer de descrever o que saí de dentro. Urgente.

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