Ando meio desligada

 

Imagem gerada no DALL-E Bing e Leonardo.ai

As palavras me faltam. No meio do raciocínio, brancos latentes me entontecem. Os termos, antes tão familiares e amigáveis, saltavam feito borbotões. Na escrita, no meio do flow criativo, surgiam como visitantes andarilhos se imiscuindo nas sendas da vida. Alguns semi desconhecidos que, indo procurar nos dicionários, faziam todo o sentido. Em algum lugar da memória tinham se alojado para serem colocados à luz quando necessário. Minha mente era ágil. Eu era tão mais jovem. Hoje ando meia desligada. Não consigo dar conta de tanta informação. Rareiam as certezas absolutas. Não consigo mais acompanhar a rapidez dos acontecimentos. Não nasci para esta era que anda a jato. Meu tempo é dos passos firmes no chão. Caminhadas em torno da lua, das quimeras e dos andaimes que constroem com passos lentos as edificações de vida. Tomo água porque nosso corpo é feito basicamente dela. As nuvens que antes queria tocar com meus dedos infantis, correm céleres nos céus e delas observo, fascinada, o bale. O tempo anda. O tempo aprisiona. O tempo conforma. O tempo existe dentro das nossas definições que nem sempre correspondem ao correr dos ponteiros. Nana Caymi canta com sua voz que aconchega sobre o tempo que se rói de inveja das paixões que vivemos. As notificações me tiram da concentração do escrever. Já pedalei, já fiz reuniões, já fiz das mais prosaicas às mais complexas tarefas nesta manhã de segunda que teima em não querer ser simplória.

Mais reuniões. Decisões. Nestas horas não posso estar desligada. E não estou. Sou focada no trabalho. Sou navegante na vida.

Tento escrever. Amadurecer em qualquer época da vida nunca é um processo fácil. Amadurecer encarando a finitude de quem me cerca e a minha é particularmente difícil. Mexe nas entranhas. Abala os alicerces. Aprendi que nas horas em que a vida e a resolução dela não depende apenas dos nossos esforços, é mais sábio viver um minuto de cada vez. Era momento de cada vez. Mas o ato falho talvez explique melhor a velocidade exigida para viver o presente. Há urgência. E ao mesmo tempo há plenitude. Há carência e ao mesmo tempo, imensidão. Há que encarar a roda da vida. Ao mesmo tempo que a vivo. E a faço girar. Mesmo com as engrenagens rangendo e carecendo de manutenção. Diária.

Como não ficar desligada? É defesa e mistério. É se deixar pousar nas nuvens do esquecimento e do cuidado com as emoções. Quando estas são tão intensas, há que vivê-las com parcimônia para não ser engolida pela voragem.


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