Vício nosso de cada dia - livrai-me do mal

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

Pessoa que em plena pandemia e processo de mudança de hábitos, tentando ser mais focada no que faz bem e se aproximar da maestria, faz o quê? Baixa um desses app de atacar gulosamente doçuras, às vezes com bombas de feito devastador, a melhor delas um brigadeiro confeitado.

Obvio que deixou de lado as leituras de Clarice, os filmes cabeça e o curso de crônicas. Este último já tinha deixado antes, quando se deparou com os condicionantes da escrita. Logo a atividade que faz com mais liberdade! Deixou de lado, junto com a arrumação do quarto, dos papéis e tudo o mais que é chato e aborrecido, assim tudo junto para ser mais dramática.

Veio aquela sensação já conhecida e temida. O vício. A vontade de ficar mexendo o dedinho para cima e para baixo e ganhar etapas com figurinhas infantis elogiando como se a pessoa fosse a doçura mais inteligente da face da terra. Carência define?

Logo ela que detesta ser dependente de qualquer coisa. Que não curte muletas emocionais, que não fuma, bebe moderadamente, nunca se drogou talvez até porque vive mesmo em alfa e precisa de algo que a fixe na Terra. Pés no chão mesmo que seja esférica.

Lembrou da época em que resolveu enfim tirar a carteira de motorista da bolsa, já meio desgastada por uma década de não uso e foi enfrentar o monstro de rodas e direção. No começo usou de um subterfúgio. Balinhas. Chupar balinhas trazia um alívio e serenidade para as pernas que não cansavam de tremer nas subidas mais amenas. Isso que ela sabia parar o carro com os pedais, mesmo nas mais íngremes. Mas sei lá, o perfeccionismo a deixava insegura. Até que um dia ficou sem balinhas e precisava sair. Síndrome de abstinência! A alma ariana (de signo) e tedesca de herança falou alto: não vou ficar viciada em balinhas. E não ficou! 

Cortadas as balinhas, a direção, se não se tornou íntima, se tornou comum e rotineira porque por obvio a sensação de independência falou mais alto que qualquer insegurança.

E agora de novo as balinhas se fazendo de sucedâneo para a vida lá de fora. Algo que consumir com volúpia e sem culpa. Quase sem culpa. Vá lá, com culpa, mas com prazer. E leveza. Até que...

Deixa de ser leve e vira compulsão. Deixa de ser prazer e vira obsessão. Perde o tesão. Nem nos vícios eu aguento a falta de sentido e leveza.

Solução? Mais rápida e fácil que as da vida real, dedinho dá uma última chance e não tendo resultado, deleta.

Deletar! Ô palavrinha libertadora dos tempos tecnológicos! Melhor que matar, melhor que destruir, deletar é mais rápido e indolor. Não serão balinhas, reais ou virtuais, que me farão ficar dependente.  
 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

amantes eternos (divagações com a IA)

Dos meus pertences

Das podas necessárias