Porque risoto e não sagu
Confesso.
Tenho uma enorme dificuldade para aguardar algo. Tudo o que requer paciência de algum modo, me é difícil. Caminho rápido, detesto filas, odeio quem conta histórias com minúcias e já fico adivinhando o final. E cortando quem fala.
Descubro os mistérios dos livros, adoro spoilers e leio o final antes de acabar. Aliás não apenas leio o final, como pesquiso na internet sobre tudo o que vai acontecer nos livros, séries e filmes.
Definitivamente não nasci para os mistérios que custam a ser revelados.
Com tudo isso, sou procrastinadora. Contraditoriamente e infelizmente eu adio o que não comecei. Adio terminar o que começo rápido. Um paradoxo? Talvez, nunca disse que era alguém especialmente decifrável, embora adore me rotular de coerente. Talvez o seja. Coerente com a minha incoerência.
Em geral me aceito assim.
Engulo a comida aos pedaços, corro na frente das pessoas que caminham comigo e só me dou conta quando elas começam a gaguejar de cansaço.
Meus exercícios para trabalhar a pressa passam pela culinária. Não que a gastronomia seja uma paixão. Não tenho paciência para ela. Uso temperos por instinto, misturo doces e salgados em pestanejar. Não sigo regras. Mas tem duas coisas que aprendi a fazer, que exigem paciência e que curto demais.
Uma delas é fazer pão. Mas fazer pão na mão. Misturar tudo com os dedos, sovar com calma, deixar crescer. Esperar. Sovar de novo, colocar na forma, deixar novamente crescer. Assar. O fazer o pão é um exercício de crescimento e paciência.
Outra é fazer risoto.
Para fazer um bom risoto é preciso namorar o fogão. Passar um tempo ali do lado, entender o tempo de cada ingrediente. Mexer muito. Fazer o brodo com vegetais e temperos. Deixar o vinho soltar o álcool. E mexer. Saber a hora exata de misturar o caldo. Sentir o arroz. Mexer. Tudo com muita paciência, com muito carinho, com muita sensualidade.
Mas porque risoto e não sagu?
Pode parecer uma pergunta boba. Mas porque determinadas escolhas na vida nos levam a enfrentar nossas deficiências, encarar desafios, nos exercitar até que viramos mestres? Ou se não tanto, pelo menos chegamos ao final com bons resultados?
Porque uns nos desafiam e a gente encara. E outros a gente tenta, mas não rola sentimento. Acabamos mas não repetimos? O mesmo processo, mas não é isso que nos leva a perseverar. A vida não é feita apenas de força de vontade.
É preciso algo mais. Uma paixão ou um motivo que nos acode por dentro. Por isso fazer risoto é prazer. Enquanto mexer sagu é sacrifício que não se repete, por mais que se goste de comer.
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